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Reflexões

A representação do homem homossexual nas novelas globais

As novelas são uma ferramenta de grande poder quando falamos de influência cultural. Elas ditam moda, estilo de vida, tendências musicais, pessoas “hypes”, etc. Na minha análise em particular, irei falar das novelas das oito e das sete da Rede Globo, e a influência que elas fazem em relação aos homossexuais.

A novela das sete é uma novela mais humorística, porém, tende à comédia, ou seja, o ato de fazer graça nestas novelas não tem um propósito de fazer rir de acordo com algo mais sério como se vê em charges ou até mesmo no Jô Soares. A comédia nas novelas das sete leva os assuntos ao ridículo, ao que é clichê. Os homossexuais que são personagens destas novelas sempre são extremamente afeminados, de certa maneira promíscuos, solitários e amigos das mulheres supostamente de baixo escalão. Em contrapartida sempre existe, no cargo de personagem principal, o homem perfeito que possui todas as mulheres, ou a mulher moderna heterossexual. O homossexual sempre possui pequenos papéis, ou até mesmo chega a ser somente um figurante, que será pobre, que se veste de mulher e é atrevido.

O quadro muda radicalmente na novela das oito, que por ser a novela principal da Rede Globo, é a principal vinculação para ditar tendências, inclusive no âmbito social. Nesta vinculação, os homossexuais sempre se comportam como homens heterossexuais, são belos, são bem sucedidos ou possuem uma vida equilibrada em família, só possuem um parceiro (ou só tem a pretensão em um personagem específico), porém, nunca se vê um simples beijo. É tudo bem claro, os personagens são explicitamente homossexuais, não é objetivo da novela deixar algo subjetivo.

São duas novelas de características diferentes, com diferentes abordagens aos homossexuais e logicamente, diferentes influências culturais. Antes de tudo, a de se perceber que os personagens homossexuais nunca são interpretados por atores homossexuais, são sempre feitos por atores heterossexuais (lógico que podem haver exceções). Isso, ao meu visto, distancia ainda mais estes tipos de personagens ao público, ainda mais por serem personagens secundários, não se vê um ator que faça o papel de si mesmo. Um caso onde podemos ver isso claramente é o Miguel Falabella, todos sabem que ele é homossexual, porém quando atua, sempre tem um papel de “homem garanhão”. Não que haja uma necessidade do ator interpretar “a si mesmo”, mas isso acarreta certas coisas, que irei dissertar mais a frente.

O que eu percebo, é que a pessoa homossexual, de alguns anos para os dias de hoje, teve maior espaço nas novelas, porém, os estereótipos são formados e a sociedade caminha com eles. As novelas das sete mantêm a imagem clássica do homossexual, pobre, afeminado, desaforado e promíscuo. As novelas das oito há pouco tempo começa a mostrar o homossexual “bom partido”, comportado e com relacionamentos fixos e aceitos pelo seu cotidiano. Neste caso, em relação ao homossexual das sete, percebo que o “bom partido” sempre é bem sucedido, o afetado, é sempre pobre, e se fica com dinheiro, gasta com futilidades.

A primeira influência cultural que percebo é esta. Não é a toa que quando as pessoas vêem um gay afetado, logo o julgam de “bicha de Madureira”, e aquele gay, que está bem vestido e comportado é a “bicha da zona-sul”. Há um julgamento por classe social. O estereótipo formado, neste âmbito, é que o gay, ou é promíscuo do mais baixo escalão, ou é comportado. Isso não é uma demonstração do real, o que vejo entre amigos, saídas à noite é que há uma grande variedade de “tribos homossexuais”, há claramente o afetado das sete, e o “bom partido” das oito, mas há várias outras variações, inclusive misturadas.

Penso que isso influência muito a sociedade a repudiar os homossexuais afeminados, pois estes seriam necessariamente aquilo que não é ideal. É o homossexual que deseja o homem das mulheres, o que quer ser uma mulher, o mal educado, vergonhoso, e principalmente, promíscuo e, se falando de sexo, sempre é julgado a estar no papel passivo na relação sexual. É um julgamento que não possibilita uma argumentação, pois as pessoas de modo geral, não chegam a se aproximar destas pessoas, pois supostamente já sabem o que aquela pessoa é, e o que ela é não é uma coisa boa. É algo que deve ficar escondido nos subúrbios e fonte de comédia barata para novelas.

O julgamento ao homossexual “comportado” é extremamente diferente. Além de ser possível uma socialização, é pré-suposto que ele não ficará tentando ter relações com o primeiro rosto bonito que aparecer, é bem sucedido, mora na zona-sul, entende de moda, é o melhor amigo das meninas, e, o melhor para todos, sua relação está longe dos olhos públicos, e estas novelas nunca se aprofundam na questão sexual, pois não se quer saber da atividade ou passividade sexual destes casais, isso foge da simples aceitação, entra no campo do real convívio em compreensão. O que vejo com extrema clareza, é que quando uma novela mostra um casal “bacana” de homossexuais, mas, nunca mostrar um único beijo, é que ela quer aceitar, mas não quer a relação próxima, a novela sugere à sociedade a aceitação destas relações, mas que isso não avance o simples aceitar. O conviver é outra estória; conviver é só com o “garanhão” das sete, ou com o “bom partido” das oito.

Devido a isso, quando gays “comportados” se beijam em público, são logo taxados como “não comportados”, o que acarreta a um julgamento semelhante ao da “bicha de Madureira”, eles não são mais bem aceitos, são alvos da comédia.

Talvez seja por causa disso que atores homossexuais poucas vezes tomam papéis de personagens gays. Fazer isso pode parecer ao público que é fazer uma “declaração” de sua sexualidade, o ator, estaria saindo de sua vida homossexual longe dos olhos públicos e estaria tornado-a pública, logo, não estaria de acordo com os quesitos que a sociedade acaba impondo para o bom homossexual, que de certa maneira, o seu lado gay deve estar distante, preso dentro de um quarto.

Devido a estes fatores, e a minha experiência pessoal com esse universo, percebo que o que as novelas das sete e das oito fazem, é uma formulação de estereótipos do que deve ser motivo de riso e discriminação, e o que é razão de simples aceitação, com uma relação subjetiva e não íntima, pois o lado homossexual de uma pessoa, de acordo com o proposto destas novelas, deve ser resguardado à intimidade, pois sendo óbvia (como nos personagens da novela das sete) a pessoa homossexual é comédia.

O que falta à sociedade é a compreensão de que o homossexual não quer ser uma mulher, é uma simples questão de afetividade. Enquanto esta mentalidade for preservada por vinculações extremamente influentes como a novela, esta discriminação será mantida. Esta influência é óbvia, percebo que em alguns anos, a sociedade começou a aceitar o homossexual, desde que não seja o(a) próprio(a) filho(a); em alguns anos as novelas das oito começaram a mostrar o homossexual de forma mais aceita, essa relação não é simples coincidência, é evidência da venda de estilo de vida e mentalidade que a novela faz para determinado público. Mas ainda falta muita coisa, não é por motivos ingênuos que o programa “Vídeo-Game” da Angélica, no dia vinte e oito de Junho, “Dia Internacional do Orgulho Gay e Lésbico”, teve seu quadro da brincadeira de fantasia baseado em “drags queens”. Por enquanto, somente o gay “bem sucedido” tem espaço, os outros, são simples fontes de riso.

Discussão

Um comentário sobre “A representação do homem homossexual nas novelas globais

  1. Esse artigo eu já conheço!

    Publicado por Vítor Vieira | 19 de dezembro de 2008, 12:45 AM

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